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Ajahn Chah |
Ajahn Chah nasceu a 17 de Junho de 1918, numa vila rural situada perto da cidade de Ubon Rajathani, no nordeste da Tailândia.
Viveu a primeira parte da sua vida como qualquer outro rapaz na ‘Tailândia rural’ da época, no seio de uma grande e agradável família. Seguindo a tradição, depois de completar o ensino básico ordenou-se como monge noviço, no mosteiro local da vila.
Três anos depois voltou para casa dos seus pais, para ajudar com os trabalhos da quinta, mas sentindo uma atracção pela vida monástica, aos vinte anos decidiu ir de novo para o mosteiro e ordenar-se como bhikkhu.
Passou os primeiros anos da sua vida de bhikkhu a estudar as bases do Dhamma, o Vināya (código monástico; disciplina), a linguagem Pāli e as escrituras. No seu quinto ano de monge, o seu pai ficou seriamente doente e faleceu. Este brutal acontecimento tornou evidente, para Ajahn Chah, a fragilidade e a precariedade da vida humana; fê-lo reflectir profundamente acerca do verdadeiro propósito da vida, pois apesar de ter estudado exaustivamente ele não se sentia mais próximo de ter uma compreensão pessoal acerca do fim do sofrimento. Com tudo isto, à medida que se dedica à tradução de comentários do Dhammapada, apercebe-se da disparidade entre a sua vida e a dos monges da época do Buddha, na qual eles vagueavam nas florestas «solitários, impetuosos e determinados»; e ele ali estava, agarrado aos livros na sala de estudo do mosteiro. Um sentimento de desapontamento apossou-se dele e emergiu o desejo de descobrir a verdadeira essência do Budismo. Finalmente, em 1946, abandonou os estudos e partiu em peregrinação.
Caminhou durante vários anos pernoitando em florestas e recebendo comida nas vilas pelas quais passava no seu caminho, despendendo temporadas em mosteiros, assimilando os ensinamentos e praticando meditação. Foi durante a estadia no mosteiro de Wat Kow Wongkot que, pela primeira vez, ouviu falar de Ajahn Mun, um Mestre de Meditação altamente reverenciado. Um leigo informa-o onde este se encontra e Ajahn Chah, entusiasmado por se encontrar com um mestre realizado, parte em direcção ao Nordeste, em busca de Ajahn Mun.
Assim que entrou no mosteiro onde Ajahn Mun se encontrava, Ajahn Chah foi invadido pela atmosfera tranquila e discreta do sítio. O silêncio estava carregado de vibração.
Por esta altura Ajahn Chah debatia-se com um problema crucial. Havia estudado os ensinamentos acerca de moralidade, meditação e sabedoria, apresentados de forma precisa e detalhada, mas não conseguia compreender como é que estes poderiam ser postos em prática.
Depois de prestarem os devidos respeitos Ajahn Chah expôs a sua questão ao que Ajahn Mun respondeu mencionando que, apesar dos ensinamentos serem realmente extensos, na sua essência eles são muito simples. Com consciência, se virmos que tudo surge no ‘coração-mente’…aí está o verdadeiro caminho! Este sucinto e directo ensinamento foi uma revelação para Ajahn Chah, transformando o seu modo de praticar. O caminho estava claro! Ajahn Mun aconselhou-o sobre o princípio básico dos ‘Dois Guardiões do Mundo’: hiri (um sentido de vergonha consciente) e ottapa (medo inteligente das consequências). Falou-lhe também do Caminho Óctuplo, sobre as Quatro Estradas para o Sucesso Espiritual e os Cinco Poderes Espirituais, falou sobre a forma como as coisas realmente são e sobre o caminho para a libertação. Ajahn Chah ficou em êxtase.
Mais tarde Ajahn Chah referiu que apesar de ter chegado muito cansado, após ouvir Ajahn Mun toda a fadiga desapareceu e ele sentiu-se leve, com a mente clara e tranquila.
No dia seguinte Ajahn Mun deu mais ensinamentos e Ajhan Chah estava agora esclarecido quanto à sua prática. Sentiu uma alegria e um êxtase no Dhamma como nunca antes. Um dos ensinamentos de Ajahn Mun que mais o inspirou foi o do Sikkhibhuto, ser ele próprio ‘Testemunha da Verdade’ e uma das explicações mais esclarecedoras foi a da distinção entre a mente e os estados transitórios que surgem e desaparecem dentro dela, os quais muitas vezes acreditamos serem reais, identificando-os com a própria mente.
Durante os sete anos que se seguiram Ajahn Chah praticou ao estilo austero da Tradição da Floresta, deambulando pelas florestas em busca de locais calmos e seclusos onde pudesse desenvolver a sua meditação. Viveu em selvas repletas de cobras e tigres, usando reflexões sobre a morte para penetrar o verdadeiro significado da vida.
Em 1954 foi convidado a voltar à vila onde nascera e instalou-se numa floresta dita ‘assombrada’ chamada ‘Pah Pong’. Apesar da malária, do abrigo precário e da pouca comida, muitos discípulos juntaram-se à sua volta. Ali começou o mosteiro hoje chamado ‘Wat Pah Pong’ e muitos outros mosteiros afiliados se espalharam por toda a Tailândia.
Os ensinamentos de Ajahn Chah contêm aquilo que se pode chamar de ‘coração da meditação budista’ – as práticas simples e directas de acalmar o coração e abrir a mente para a verdadeira compreensão da verdade. Esta forma de constante vigilância tem vindo rapidamente a crescer como prática Budista no Ocidente, ensinando-nos a lidar com os estados mentais mais densos, como os medos, a ganância ou o sentimento de perda e a aprender o caminho da paciência, sabedoria e compaixão altruísta.
Segundo Ajahn Chah o treino da mente não se trata apenas de nos sentarmos com os olhos fechados ou de aperfeiçoarmos uma técnica de meditação. Trata-se de uma grande renúncia.
Uma das mais notáveis características do ensinamento de Ajahn Chah é a ênfase que ele deu à ordem monástica – o Sangha – e ao seu uso como veículo para a prática do Dhamma. Os resultados que obteve ao criar e ensinar comunidades monásticas sólidas são bastante evidentes nos inúmeros mosteiros que por seu intermédio se criaram e desenvolveram.
No entanto, não se pode de forma alguma negar a sua particular habilidade para ensinar a comunidade leiga com a qual ele comunicava de forma brilhante, independentemente da condição humana e social desta.
O estilo de ensinar simples mas profundo de Ajahn Chah era particularmente apelativo para os Ocidentais. Em 1966 o primeiro monge Ocidental, o Venerável Ajahn Sumedho, veio para Wat Nong Pah Pong. A partir de então o número de visitantes ocidentais começou a aumentar consideravelmente e cerca de sete anos após a chegada do Venerável Sumedho, formou-se um novo mosteiro do qual este viria a ser o abade – Wat Pah Nanachat (Mosteiro Internacional da floresta).
Em 1977 Ajahn Chah e Ajahn Sumedho são convidados a visitar Inglaterra, onde dois anos mais tarde seria fundado o primeiro mosteiro europeu da tradição da floresta, Chithurst Buddhist Monastery. Por essa altura Ajahn Chah visitou de novo o Reino Unido, deslocando-se também ao Canadá e aos Estados Unidos para dar ensinamentos.
Em 1981 Ajahn Chah ficaria doente, permanecendo acamado até ao fim da sua vida. Este acontecimento levou a que durante dez anos monges se revezassem nos cuidados ao mestre criando desta forma um sentido ainda maior de comunidade.
Em 1992 Ajahn Chah morre deixando para trás uma fervilhante comunidade de mosteiros na Tailândia, em Inglaterra, Suíça, Itália, França, Austrália, Nova Zelândia, Canadá e Estados Unidos da América, onde se continuam a praticar os ensinamentos do Buddha através da inspiração deste grande professor de meditação.
Neste momento, com a existência do Mosteiro da Tradição da Floresta em Portugal, este país fica assim também privilegiado e abençoado com a sabedoria e o legado de Ajahn Chah.